Solidariedade do Oiapoque ao Chuí

No fim de 2019, a LBV soma esforços e distribui mais de 840 toneladas de alimentos por todo o Brasil

Irâ Evangelista

Por incrível que pareça, a escolha do que comer não é condição acessível a todos. Ainda há muitos brasileiros que mal garantem as refeições diárias, nem mesmo o tradicional arroz com feijão. Segundo o relatório “O estado da segurança alimentar e da nutrição no mundo”, divulgado pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), mais de cinco milhões de indivíduos sofrem com a escassez de alimentos em nosso país.

Associa-se a esse cenário outra preo­cupante realidade constatada pela Síntese de Indicadores Sociais (SIS), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): desde 2015, o número de miseráveis aumentou. Em 2018, 13,5 milhões de pessoas tinham renda de até US$ 1,90 por dia, ou seja, viviam com cerca de R$ 145 mensais, o que, de acordo com o Banco Mundial, caracteriza um quadro de pobreza extrema. Trata-se de uma população maior do que a de alguns países da América Latina, como da Bolívia, da Bélgica, de Cuba, da Grécia e de Portugal. Dentre as principais causas para essa situação, destaca-se o alto índice de desemprego, já que atinge, de acordo com o IBGE, mais de 12 milhões de cidadãos.

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A fim de aliviar o sofrimento dos que enfrentam a fome, a Legião da Boa Vontade distribuiu, durante o mês de dezembro, 42.081 cestas de alimentos não perecíveis nas cinco regiões do país. Isso graças à ajuda do povo, que, mais uma vez, apoiou a tradicional campanha Natal Permanente da LBV — Jesus, o Pão Nosso de cada dia!, a qual coroa o atendimento que a Instituição presta, ao longo do ano, a famílias em situação de vulnerabilidade social e também auxilia a outras comunidades socorridas por entidades parceiras. Na reportagem a seguir, o leitor conhecerá alguns relatos daqueles que fizeram parte dessa mobilização solidária e o impacto dela na vida dos beneficiados.

Vânia BesseAlagoa Grande, PB — Moradores dos Sítios Barreiras da Comunidade Caiana dos Crioulos recebeu, por intermédio da Rede Sociedade Solidária, da LBV, cestas de alimentos e kits de limpeza e higiene para amenizar prejuízos causados pela pandemia do novo coronavírus.

Dignidade aos “esquecidos”
E
m abril de 2019, a FAO alertou para a persistência da fome e da pobreza em “territórios esquecidos” em nações da América Latina e no Caribe. Quanto ao Brasil, a região nordestina foi citada pela agência da ONU como exemplo de localidade que sofre com essas duas situações. “Estamos falando de municípios em países como Colômbia, Peru, República Dominicana e Brasil, que fizeram progressos significativos no seu desenvolvimento, mas que ainda possuem crianças com fome, que crescem com as vidas mutiladas por desnutrição crônica”, afirmou Julio Berdegué, sub-diretor-geral e representante regional da FAO.

Um dos principais problemas que assolam o Nordeste brasileiro são as estiagens prolongadas, a respeito das quais há registros desde o século 16. Felizmente, a condição climática melhorou entre novembro de 2018 e abril do ano seguinte. Todavia, as precipitações ocorreram de maneira irregular em relação a tempo e espaço. Nas cidades onde predominaram, a “seca verde” fez-se presente: ela colabora com a exuberância da vegetação, mas não garante a safra em áreas não irrigadas, como nas convencionais culturas de feijão, de milho e de mandioca. Portanto, os agricultores mais pobres, que cultivam de maneira bastante rudimentar, quase não viram benefício para a lavoura deles a maior incidência de chuvas, que ainda não foi suficiente para encher os reservatórios de água.

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 As características geográficas também pesam na qualidade de vida. Habitando em alguma metrópole, o desempregado pode manter esperanças de novo serviço ao distribuir seus currículos às empresas. Já no sertão, as famílias mais humildes, tantas vezes isoladas em suas roças, chegam a enfrentar dificuldades até mesmo para ir ao povoado mais próximo buscar itens básicos para a sobrevivência. Sem chuva abundante e sem ter a quem pedir emprego, a possibilidade de trabalho é ameaçada e, por conseguinte, a renda. Ainda que a família receba algum tipo de benefício social, as necessidades prioritárias, com exceção da comida, como roupas, remédios, transporte, entre outras, tendem a não ser supridas.

É o caso de Maria Eneide de Lima, moradora do município de Pedra/PE, localizado a 250 quilômetros de distância da capital, Recife. No lar, três pessoas sobrevivem com R$ 180 mensais. “Meu esposo só trabalha quando aparece [alguma oportunidade], porque a gente vive de agricultura, e, no momento, não estamos trabalhando em nada. Nós nos sustentamos só com o Bolsa Família. Já passei dificuldade, não vou mentir, não. Teve dia de faltar as coisas dentro de casa, mas a gente ‘bota’ Deus na frente e ‘vamo simbora’”, contou à equipe da revista BOA VONTADE.

Ao receber a cesta de alimentos da LBV no dia 11 de dezembro, a atendida declarou quanto é grata. “Não há nem palavras [para agradecer], porque é um gesto lindo que vocês fazem pra gente daqui. Eu mesmo agradeço de coração. Fico muito alegre, muito, muito, muito mesmo. Obrigada ao pessoal da LBV. Que Deus [os] abençoe!”

Helen Winkler/Diego Ciusz

No dia 13 daquele mês, foi a vez do município de Alagoa Grande/PB receber a caravana solidária da Legião da Boa Vontade. Ao chegar à comunidade quilombola de Caiana dos Crioulos, foi grande a alegria que o caminhão cheio de comida proporcionou aos habitantes do lugar. Ao fim da distribuição, Francisco Irineu, diretor da Escola Firmo Santino da Silva, narrou o que observou: “Todos estavam maravilhados. Eles perguntavam: ‘vem carne seca dentro da cesta?’ Vem carne seca! ‘A carne está cara. Graças a Deus!’ Então, com a ceia de Natal dessas famílias, a LBV contribuiu. Não vou nem me prolongar mais, porque está me dando vontade de chorar, pela felicidade que é essa ajuda”.

Francisco emocionou-se, a ponto de embargar a voz. Ele falou como é duro sentir-se à margem da sociedade: “Somos quilombolas e sofremos por falta de políticas públicas voltadas para a nossa comunidade. Somos, na maioria, negros e sofremos por isso, mas venceremos. Graças a Deus, estamos juntos nessa luta com a LBV. Que essa campanha se espalhe ainda mais por todo o Brasil, abrangendo aquelas famílias mais carentes!” E revelou a dignidade e o conforto que a Instituição ofereceu à população local: “A comunidade Caiana dos Crioulos necessita muito de ajuda, de colaboração, de Humanidade, de gestos de carinho, como a LBV faz”.

 

“Os 70 anos da Legião da Boa Vontade é uma coisa que emociona e faz parte das nossas vidas. É uma organização séria. Seja colaborador, ajude de coração. Eu sou a prova de que vocês [da LBV] estão fazendo um belíssimo trabalho para com aquelas pessoas necessitadas. Muito obrigado a todos os colaboradores. Vamos ser doadores da LBV, porque ela merece.”

Francisco Irineu
Comunidade Caiana dos Crioulos, Alagoa Grande/PB

 

Vivian R. Ferreira

LBV leva Esperança ao vale da pobreza
Formado por 51 municípios no Nordeste de Minas Gerais, o Vale do Jequitinhonha caracteriza-se pelos indicadores sociais mais baixos do Estado. Os números atrelados à expectativa de vida, à escolaridade e à renda são muito inferiores à média nacional. Ciente dos desafios da localidade, a Legião da Boa Vontade abrangeu 12 cidades com sua campanha natalina, a exemplo de Araçuaí, onde a distribuição de cestas ocorreu em 2 de dezembro.

Helen Winkler/Diego Ciusz
Grato por ter sido assistido pela iniciativa no referido município, Carolino Pereira dos Santos ressaltou: “A LBV não exclui ninguém, ela só ensina o Bem. Agradeço ao José de Paiva Netto [, diretor-presidente da Entidade], que, mesmo sem conhecer pessoalmente, é um pai para mim. Ao ajudar a LBV, só [se] tem a ganhar. Às vezes, não se vê materialmente os benefícios de ajudar o próximo, mas espiritualmente vocês vão ver. Muito obrigado [aos colaboradores]!”

Por sua vez, Maria dos Anjos Mendes, que participa do serviço Vida Plena — o qual oferece a idosos atividades como artesanato, dança, práticas esportivas, passeios culturais e palestras educativas pertinentes à terceira idade —, agradeceu pela iniciativa de fim de ano e pela inauguração, em 14 de agosto de 2019, do novo Centro Comunitário de Assistência Social da LBV na cidade. Para ela, “foi incrível a vinda da LBV para Araçuaí. Que os doadores continuem contribuindo, conheçam o trabalho, o serviço da LBV! Que eles passem a saber mais o que Entidade representa na vida das pessoas, para doarem de coração mesmo, porque [ela] ampara os que mais precisam!”

Quanto à doação recebida, Maria não poupa elogios: “Além de saciar a fome, também traz um momento de alegria (…). Na situação em que a gente está, ganhar uma cesta maravilhosa dessas é muito bom. Estou feliz não só por mim, mas por tanta gente que recebeu a cesta!”

Motivos para a LBV estar presente no município não faltam. De acordo com o IBGE, estima-se que Araçuaí possua mais de 36 mil habitantes, dos quais apenas 11,5% têm alguma ocupação profissional, e, entre esses, o salário médio era de 1,7 salário-mínimo em 2017. No ano de 2010, época do último censo, apenas 38,3% das residências contavam com esgoto sanitário adequado.

Helen Winkler/Diego Ciusz

Na capital paulista, quase  4 mil famílias beneficiadas
Apesar de ser a maior metrópole da América do Sul e o principal polo econômico do país, São Paulo/SP possui ainda mais de 700 mil cidadãos vivendo em situação de extrema pobreza, como aponta o IBGE. Outros indicativos também preo­cupam, como a falta de moradia e a exposição à violência e à fome em regiões diversas na cidade.

Por isso, em 19 de dezembro, a LBV abriu as portas do Conjunto Educacional Boa Vontade para entregar 73 toneladas de alimentos a quatro mil famílias que enfrentam enormes desafios. Uma das beneficiadas, Carlinda Muniz de Andrade, explica que, do minguado salário do marido, vem a única renda para manter todos da residência, entre os quais cinco crianças e um idoso. “Na minha casa, são nove pessoas, e só um trabalha para sustentar todas essas bocas. Essa cesta de alimentos chegou na hora certa. Como Deus é bom!”, exclamou.

Entre os voluntários que participaram da distribuição, havia vários colaboradores da Entidade, a exemplo de Mario Edson da Silva. “Contribuo todos os meses. Tenho 72 anos e estou aqui espontaneamente. A fome é um negócio difícil, insuportável, e entregar essas cestas me faz sentir muita alegria. Se você tem [condições], por que não dar? Eu moro em Santana do Parnaíba, [são] três horas [de viagem] até aqui. Acordei 5h30 para poder vir.” Para ele, todo o esforço foi recompensado. “Estou feliz da vida! Para mim, é gratificante.” 

Helen Winkler/Diego Ciusz

Apoio ao povo sulista
No Paraná, no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, a Instituição distribuiu quase 120 toneladas de comida. A gratidão de quem recebeu esse apoio especial ficou evidente a cada conversa com os assistidos. A cidade de Pelotas/RS recebeu a caravana da Boa Vontade no dia 11 de dezembro. Na oportunidade, Elisabete Silva de Moraes declarou: “[A cesta] ajuda bastante, ainda mais pela situação difícil que passei neste ano, quando meu marido veio a falecer. Pelo menos neste fim de ano terei esse alívio”.

Maria Aparecida, moradora de Sarandi/PR, é mãe de quatro filhos e, trabalhando como diarista, criou-os sozinha após ser abandonada pelo marido. Segundo ela, “com essa ajuda, Deus me iluminou, abriu o céu [com] as estrelas, clareou tudo. Graças à LBV, estou em outro mundo agora”. E prosseguiu: “O Natal vai ter mesa farta. Deus me abençoou muito. (…) Daqui pra frente, tenho certeza de que não vai faltar mais [comida]. (…) Que Deus abençoe [os doadores], porque, com a doação do povo, nós fomos amparados!”

Helen Winkler/Diego Ciusz

Helen Winkler/Diego Ciusz

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